sábado, 9 de agosto de 2008

A herança



Eu não herdei dele os profundos e bonitos olhos verdes. Muito menos a vocação para a medicina. Herdei a determinação, a coragem, a alegria diante da vida, a paixão pelas viagens, o amor pela leitura e pela música. Herdei a vanguarda e a modernidade. Herdei o jeito como ele abraçava as mudanças e as inovações do mundo. Costumava sempre olhar para frente e aceitar a vida como ela se apresentava. Costumava dizer que o progresso era inevitável. Falava que meu jeito de ser poderia me levar ao estresse e à doença.
Herdei dele o temperamento, o gênio, a firmeza, o tom da voz. O gosto pela praia, pelos banhos de mar, pelo cinema. Descobri com ele os segredos da roça, das plantas, da terra e o amor pelos animais. E as delícias de dirigir pelas estradas afora.
Aprendi com ele a saborear uma laranja lima e cortar a banana em tirinhas colocando ao lado do arroz com feijão. Tínhamos o mesmo gosto pelos sorvetes de frutas. Aprendi com ele a torcer e a vibrar pelo Fluminense, a ser honrada, digna e ter caráter.
Meu pai Ary adorava festas, gostava de dançar, conversar, gargalhar e viver. Seus olhos brilhavam diante de uma boa mesa. Tinha sempre uma história genial para me contar, um caso engraçado ou uma piada na ponta da língua. Acompanhava os progressos na área médica mesmo aos 93 anos.
Nasceu em Minas Gerais, tinha uma alma árabe, e era um pediatra que não disfarçava sua preferência pelas meninas. Não foi um homem fácil. Sofri com ele na adolescência. Mas com a idade decidiu afrouxar as rédeas.
Tocava todos os dias a campanhia da minha casa. E quando eu abria a porta, sorria e ia entrando dizendo:
-"Bom dia, guerreira." Parecia me preparar para o futuro.
Dele herdei a perserverança e a decisão de seguir em frente e nunca desistir.
Neste domingo em que o Brasil comemora o dia em homenagem aos pais, todos os meus pensamentos são para você.
Sua benção, meu pai!

6 comentários:

Anônimo disse...

Tia Lili,
Felizes aqueles que conseguem ver o que não está explícito; sentir o oculto, amar o amor principalmente quando contido nas coisas triviais do dia a dia.
A voz que chamava de guerreira, mesmo sabendo de seus medos.
O essencial é invisível aos olhos, indescritível com palavras.
Lembre sempre dele pelo que continua sendo: um exemplo. Os exemplos só precisam acontecer uma única vez.
beijos,
Beto.

Anônimo disse...

Meu caríssimo Beto, personagem de "SENTENÇA OU RENOVAÇÃO", amigo e companheiro de uma vida.
Dr. Ary nunca será esquecido. Está no meu jeito, na minha forma de ser, sou quase um clone.

Kiki disse...

Poxa minha amiga, como lembrei do meu pai........mais do q. durante o dia todo . Como vc tem o "poder" de descrevendo o seu, me fazer "encontrar/lembrar" o meu? Meu pai não gostava de nada do que o seu gostava, mas eles eram iguais? pq?
Obrigada pelas boas e doces lembranças....
Beijos
Quilma

Anônimo disse...

Minha querida Quilma, que bom que v. gostou.
Que bom que meu texto fêz você viajar no tempo.
Quilma, a vida tem seus mistérios não é?
Obrigada por entrar no blog. Vamos nos ver?
grande beijo e uma semana de renovação!

Paulinha disse...

Que fotos lindassssssss!!! To mto emotiva hj entao nao vou escrever mto rsrsrs saudades do meu papi!!!

Anônimo disse...

Meu amor, ao fazer este texto, chorei copiosamente. Mas as lembranças de grande momentos nos faz seguir em frente.
Tem saudade da big aunt também?
Qualquer hora tô indo....
bj